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O cogumelo e o vagão errante
Venha conhecer Carantelo e a Biblioteca Mágica
Olá, Viajante!
Depois de não publicar nada em Agosto e apenas repostar um conto antigo em Setembro, trago finalmente uma história inédita e original!
Como em vários anos, participei esse mês do Desafio de Drabbles da Plusfiction, onde somos desafiados a escrever uma história de 31 capítulos, onde cada um deles deve ter apenas 100 palavras - é muito pouco, juro! - e uma dessas palavras deve ser uma “palavra do dia”, escolhida pelos adms do site.
A história de Carantelo surgiu sem querer, mas sempre me surpreendo com o resultado no fim. Escrever aventura e fantasia em 100 palavras é sempre um desafio, mas sempre acabo muito feliz, e esse ano não foi diferente.
Então, sem mais delongas, vamos estacionar o vagão e conhecer a Biblioteca…
O Cogumelo e o vagão errante
Dia 1 – Chegando na cidade (Votivo)
Cantarelo apeou o pônei ao cruzaram a ponte de pedra.
Descendo do vagão, gastou alguns minutos para tirar os arreios de Butcher, o pônei roliço de pelagem caramelo, e ficou observando enquanto o animal ia até a beirada, inclinando-se para beber água. Sorrindo, virou para observar o vagão com vinhas penduradas no pequeno telhado de telhas verdes, a lanterna da frente já acessa.
Por um juramento votivo, Cantarelo e Biblioteca eram conectados por laços mágicos. Estavam chegando perto da cidade, e ela já podia sentir a animação que fluía do vagão, pronto para receber novas pessoas nos corredores infinitos.
Dia 2 – A Biblioteca (Insofismável)
A Biblioteca não era novidade naquela cidade. As pessoas e criaturas já conheciam a história de aventura e o cuidado insofismável de Cantarelo para com o vagão. Acima de tudo, conheciam suas propriedades mágicas: a expansão do interior, o clima sempre agradável independente do ambiente, canecas de chocolate e rum dos dragões flutuando até você quando precisasse.
Cantarelo amava ver os corredores cheios de crianças, adultos e seres imortais. Sentada em um canto, com poderes, dava luz à imaginação para entreter quem quisesse.
No fim do dia, eram apenas elas novamente: Cantarelo e Biblioteca, Biblioteca e Cantarelo, juntas para sempre.
Dia 3 – Pseudo-pragas (encovilar)
Na manhã em que deixaram a cidade para trás, com Butcher marchando pela estrada montanha acima, a Biblioteca resmungou pela conexão telepática que ela e Carantelo compartilhavam.
“O que foi?”
“Pragas!”
A pessoa-cogumelo apeou novamente o cavalo, descendo com cuidado do banquinho. Entrou pela passagem mágica e logo os viu: pseudodragões. As criaturinhas gostavam de se encovilar no meio dos livros, devorando as páginas antigas.
Com paciência, Carantelo retirou cada um dos lagartos alados, deslocando-os para outro canto. Em breve, tentaria encontrar magos para adotá-los, mas, por enquanto, um pouco de comida e um cantinho perto da lareira seriam suficientes.
Dia 4 – Solitária (Clemente)
Cantarelo submergiu no rio enquanto Butcher descansava no gramado próximo. Estavam em direção do novo destino, algum lugar onde nunca estiveram antes, e a pessoa-cogumelo realmente torcia para que o caminho até lá fosse clemente: sol ameno, poucas chuvas, sem perigos no caminho.
Por vezes, Cantarelo julgava seu trabalho como solitário – até demais da conta, até mais do que ela estivera acostumada. Antes de ter sua alma ligada com o vagão, era uma aventureira. Depois, quando sua vida se tornou a vida da Biblioteca, Cantarelo aprendeu que sozinha conseguia cuidar melhor dos afazeres.
Mesmo assim, desejava ardentemente uma nova companhia...
Dia 5 – Relâmpagos fora de sintonia (Destom)
No quarto dia de viagem para novas terras, uma chuva torrencial obrigou Cantarelo e Buthcer a se abrigarem dentro do vagão. A pônei não gostava em nada quando precisava entrar na Biblioteca, mas Cantarelo a convenceu com algumas maçãs e cenouras, uma boa acariciada no pelo e uma promessa de galoparem pelas trilhas quando a chuva passasse.
Depois de passar uma xícara de chá para si mesma, Cantarelo puxou uma harpa e tocou noite adentro, relâmpagos e trovões completamente em destom.
Distraída, Cantarelo quase não percebeu o alerta da Biblioteca, que enviava arrepios por sua espinha.
“Tem alguém por perto”
Dia 6 – Lua Cheia (Tocardes)
Era Lua Cheia, madrugada perfeita para licantropos, encantamentos e rituais. Carantelo saiu de dentro do vagão, cajado nas mãos, pronta para lutar se preciso – como já lutou antes, como lutaria futuramente.
Encontrou outra pessoa-cogumelo caída no chão, ferimentos por todo o corpo, sangue para todo lado. Carantelo franziu o cenho, abaixou-se perto dela, sentindo o calor febril emanar do corpo gordo cheio de folhagens.
— Por favor... se ao menos tocardes em mim... ao menos, eu saberia que estou viva — a voz soou quebradiça, fraca, doente.
E Cantarelo tocou em seu rosto com gentileza, trazendo alívio vívido para a outra criatura.
Dia 7 – Amanita (Damejar)
Amanita era o nome da outra pessoa-cogumelo, de cabeça vermelha salpicada por pontos brancos. Aman, como gostava de ser chamado. Ardeu de febre por dois dias, enquanto Carantelo mantinha fogo sereno e pensamentos alertas. A chuva continuava, forte, o som a damejar os ouvidos das pessoas-cogumelo, evocando memórias de um passado longínquo, inexistente.
No terceiro dia, Amanita e Carantelo sentaram-se lado a lado em uma das mesas da Biblioteca. Ao conversarem, Aman fingiu ignorar o quanto lhe era surpreendente a presença de um cavalo e vários pseudodragões dentro de um vagão que julgara ser tão pequeno do lado de fora.
Dia 8 – Nova cidade (Olência)
Com o tempo, Amanita aprendeu e entendeu a história de Carantelo e da Biblioteca. E, embora Carantelo estivesse acostumada com a solidão, a presença de Aman era, de certa forma, reconfortante.
A olência das flores primaveris recebeu elas na nova cidade. Entrar em um novo local sempre fazia Carantelo tremer – afinal, pessoas-cogumelo não eram muito comuns, e um vagão mágico era menos ainda.
Mas enquanto procuravam um local para estacionar o vagão e uma baia para alugar, Aman delicadamente entrelaçou a mão com a de Carantelo, apertando de leve em sinal carinhoso.
E Carantelo respirou fundo e abriu um sorriso.
Dia 9 – Acolhimento (Inoficioso)
Embora tudo que Cantarelo, e a Biblioteca trouxessem para as cidades fosse conhecimento, magia e histórias fantásticas, as vezes a presença delas era tratada como perigosa.
Amanita e Biblioteca tentavam alegrar os ânimos de Carantelo, mas tornou-se impossível quando um ferreiro desferiu xingamentos e atos inoficiosos em direção da pessoa-cogumelo de pele amarela. Aman sentiu o corpo efervescer, a raiva tomar conta dele, mas as lágrimas silenciosas escorrendo pelo rosto de Carantelo eram mais importantes do que brigar com o ferreiro.
Naquele dia, enquanto Carantelo dormia encolhida nos braços da outra, Amanita escutou a voz da Biblioteca pela primeira vez.
Dia 10 – Ligação (Símil)
A sensação de ouvir a voz da Biblioteca era símil a mergulhar em um rio: gelada, reconfortante, um tampão nos ouvidos.
“Obrigada por cuidar dela” a voz era etérea, parecendo sussurrar nos corredores de estantes velhas recheadas de quinquilharias. Era grave e solene, e parecia ter centenas de anos.
— Como faz isso? — Amanita sussurrou, tentando não acordar Cantarelo.
“Eu me conectei com ela. E ela se conectou com você... então nós três estamos conectadas agora”
— Ela sabe?
“Carantelo não entende por completo as naturezas de nossa ligação. Nem eu entendo. Mas cuidamos uma da outra, e agora você cuidará também”
Dia 11 – Primeiro beijo (Algar)
Amanita manteve a ligação em segredo, especialmente pois sabia que Carantelo prezava aquele vínculo acima de tudo. Era fácil, considerando que a Biblioteca não estava tão interessada assim em Aman: apenas fizera o agradecimento e nada mais.
Era noite quando montaram acampamento para passarem a noite durante uma trilha particularmente difícil.
Amanita e Carantelo sentaram-se lado a lado, ombros encostados, olhando para o fogo. Mãos enroladas, cabeças juntas.
— Eu me importo muito com você.
Lábios se encontrando calidamente, hesitantes de início, mais carinhosas com o passar do tempo.
Naquele momento, nada mais existia além da pequena família dentro do algar.
Dia 12 – Passeio na floresta (Galra)
O amor de Carantelo e Amanita desenvolveu-se como uma criança que galra: devagar, com tropeços, de pouco a pouco. Não foi rápido e muito menos fácil – Amanita ainda tinha segredos escondidos dentro de si, e Carantelo seguia desacostumada a ter companhia dentro da rotina que costumava ser tão solitária.
Quando encontraram uma nova cidade – e após serem bem recebidas nela -, deixaram o vagão estacionado e fechado por algumas horas enquanto caminhavam juntas pela floresta.
— Queria te fazer uma pergunta... — A voz saiu baixa, hesitante. Aman assentiu de forma encorajadora. — O que aconteceu quando nós nos conhecemos naquele primeiro dia?
Dia 13 – Contestando (Aporético)
Amanita engoliu em seco, se afastando um passo. As mãos, antes entrelaçadas, se soltaram, os dedos escorregando como água para longe uns dos outros.
— Eu... fui atacado por uma Cobra Esqueleto — deu ombros, tentou disfarçar. Carantelo franziu o cenho, olhar aporético.
— Cobras Esqueleto não atacam Pessoas-cogumelo, Amanita.
Aman sentiu algo dentro de si doer. Seu próprio coração parecia encolher. Carantelo nunca antes a chamou pelo nome completo, e toda aquela frágil felicidade, o relacionamento construído pouco a pouco, parecia ruir de uma vez.
O cogumelo vermelho se sentou no chão; Carantelo também se sentou, braços cruzados.
— O que realmente aconteceu?
Dia 14 – A verdade (Aporia)
Amanita passou longos segundos olhando para Carantelo, refletindo o quanto amava a criatura à sua frente, pesando o quanto a verdade poderia afastá-las.
Ele não queria perder aquilo. Mesmo com pouco tempo, o vagão já parecia mais um lar do que qualquer outro lugar onde morou anteriormente.
E Carantelo era mais amor do que jamais sentira.
O momento de aporia durou mais algumas batidas de coração.
— Eu roubei algo, Carantelo. Algo importante... e, quando descobriram, fugi para longe do meu povo, do nosso povo.
— O que você roubou, Amanita?
— Um píleo, Carantelo. A vida de alguém. Foi isso que roubei.
Dia 15 – Hesitação (Cotar)
O momento se alastrou, arrastando-se como raízes de uma árvore centenária. Carantelo engoliu em seco, e Amanita imitou; roubar o píleo era o pior crime que uma pessoa-cogumelo poderia cometer. Os olhos de Carantelo se encheram de lágrimas.
— O que aconteceu?
— Carantelo...
— Me conta tudo, Amanita! Não vou te cotar como assassina antes de saber a história completa. Agora me conta TUDO!
A raiva e o medo estavam presentes, mas Amanita agradeceu a centelha de dúvida presente. A centelha de esperança. Amanita sentiu os olhos encherem de lágrimas.
— Ele ia fazer o mesmo comigo, tudo que fiz foi me defender
Dia 16 – Acolhimento (Redanho)
Carantelo sabia, racionalmente, que poderia ser mentira. A sensação de estar presa em um redanho era assustadora, angustiante.
Mas, ao mesmo tempo... ao mesmo tempo, Carantelo acreditava em Amanita. Caminhou até ela, ofereceu-lhe a mão e, quando ambas estavam de pé frente a frente, Carantelo tocou o píleo de Amanita com cuidado.
A parte mais sensível de uma pessoa-cogumelo, a base de sua vida.
— Acredito em você, Aman.
O choro veio forte, sentido, doído. Amanita carregou aquela culpa por meses, sabendo que nunca poderia voltar, nunca poderia se explicar, que nunca acreditariam nela.
Mas, ao fugir, encontrou acolhimento em Carantelo.
Dia 17 – Volta para a Biblioteca (Cognato)
Voltaram juntas para a cidade, mãos dadas novamente.
“Algo mudou” A Biblioteca cantou dentro das cabeças das duas pessoas-cogumelo, e Amanita abriu um sorriso tranquilo ao passo que Carantelo saltitava para dentro do vagão.
“Não há mais nenhum falso cognato entre nós agora, Vagão” Aman retrucou, também se espremendo pela portinhola.
Carantelo avivava o fogo da lareira. Amanita se aproximou, enlaçando a cintura e a puxando para um beijo.
— Amo você.
— Amo você.
Pelo resto da noite, a Biblioteca fez soar uma música lenta para embalar o sono de Carantelo e Amanita, que adormeceram abraçadas em uma pilha de travesseiros.
Dia 18 – Pedaço de vida (Esposar)
Na manhã seguinte, Carantelo acordou cedo para abrir a Biblioteca para as pessoas da cidade.
Do lado de fora, usou vigas de madeira para esposar a lona listrada, criando uma sombra tranquila por cima da grama. Ali, durante a tarde, estava planejada uma leitura de histórias para crianças – e para todos aqueles que estivessem interessados em ouvir.
Aman saiu um pouco mais tarde, tendo dormido em paz pela primeira vez em anos – desde o incidente, desde a legítima defesa, desde o momento que foi expulso pelos seus. Sorriram um para o outro, e Aman rapidamente se pôs a ajudar Carantelo.
Dia 19 – Procurando aventureiros (Catafracta)
Por dois dias, aquela rotina se manteve: abriam juntas a Biblioteca, recebiam pessoas da cidade inteira, doavam livros e conhecimento para aqueles curiosos.
Foi no quarto dia, quando anunciavam o fim das atividades e começavam a pensar na nova localização para levarem a Biblioteca, que algo aconteceu.
Durante a leitura para as crianças, um guerreiro usando catafracta de escamas de dragão chamou Carantelo e Amanita de lado. Com voz grossa e um saco de moedas, ofereceu um trabalho para eles.
Aman queria recusar, mas reconheceu nos olhos da outra um desejo por aventura.
E Carantelo, querendo reviver o passado, aceitou.
Dia 20 – Explorando a caverna (Sintagma)
O primeiro sinal de que algo talvez não estivesse certo foi o enigma. Depois de subir a trilha para o vale e deixarem Butcher e o Vagão em um local protegido, Carantelo e Aman foram atrás do que precisavam.
O guerreiro havia deixado um mapa com eles, levando para os fundos de uma caverna recheada de túneis. Para entrar, precisavam resolver um enigma, um sintagma, e a resposta deixava claro.
Um sacrifício precisaria ser feito no fim.
Carantelo tentou desconversar, falando sobre antigas equipes e trabalhos que havia feito. Mas havia um sentimento angustiante no pé do estômago de Amanita.
Dia 21 – Sala das Pessoas-cogumelo (Silerca)
O segundo sinal foi, sem sombra de dúvidas, uma sala escura recheada de estantes. Em cada estante, potes e mais potes de vidro, todos manchados de sangue, contendo píleos e esporos e hastes, todos etiquetados: carantelo, amanita, portabelo, morel, silerca.
Todos Pessoas-Cogumelo.
Aman estendeu a mão para pegar a de Carantelo, ambos tremendo.
— Precisamos sair daqui, Telo.
— Mas é a última sala...
— Não vale a pena! — Amanita finalmente gritou aquilo que o angustiava desde o início. — A gente não precisa do dinheiro, Carantelo.
E Carantelo entendeu. O saudosismo de seus tempos de aventureira levaram ambos até a possibilidade de morte.
Dia 22 – O começo do fim (Lacrear)
Voltar, infelizmente, não era uma opção. Cada vez que atravessavam uma nova porta, um feitiço era lançado a fim de lacrear a anterior, marcando-a com cores forte e impedindo que fosse atravessada novamente.
A única opção foi seguir.
Lutaram com espectros e esqueletos, resolveram enigmas, beberam poções torcendo para não serem veneno. Carantelo se jogou na frente de Amanita para protege-lo de uma espadada, a culpa de ter colocado eles naquela situação queimando mais do que a dor.
Depois de horas, dias, enfrentando aqueles túneis cavernosos, chegaram à um portal diferente, bonito, entalhado na pedra.
O fim da caverna esperava.
Dia 23 – O fim (Codilhar)
Na última sala, em um trono de pedra e ossos, um Rei Espectral estava sentado. Ofereceu a eles o acordo final: se conseguissem derrota-lo, poderiam levar aquilo ao qual foram atrás. Caso não...
Bem, o Rei gostava de colecionar Pessoas-cogumelo.
Por horas, Carantelo e Amanita lutaram costas contra costas, a pessoa-cogumelo de pele amarela sentindo as forças se esvaírem junto do sangue em sua haste. O cajado, sua arma de escolha, companheiro de muitas batalhas, se partiu no meio tamanho o esforço que faziam.
Mas, no fim, Carantelo conseguiu codilhar o Rei Espectral usando os poderes nefastos contra ele próprio.
Dia 24 – Prêmio final (Aloquete)
O Rei Espectral se desfez em névoa esmeralda, deixando para trás o manto, o cetro e um anel amaldiçoado. O trono também despencou em uma confusão de poeira e ossos, revelando o que foram buscar: um grande baú adornado com aloquete dourado.
Amanita cortou parte de sua túnica para fazer um curativo improvisado em Carantelo, ambos exaustos, ambos se apoiando mutualmente para saírem da caverna carregando todos os itens prometidos.
A volta para casa foi silenciosa durante a madrugada. Quando chegavam perto do vagão, as forças de Carantelo desapareceram e ela desabou, joelhos batendo com força nas pedras da rua.
Dia 25 – O pesadelo (Vicário)
A notícia da volta de Carantelo e Amanita correu pela cidade, e pessoas se amontoavam na frente do Vagão para ouvirem histórias daquela aventura.
Dias depois, o contratante deles mandou um vicário para receber o baú e deixar o restante do pagamento; ambas as pessoas-cogumelo decidiram doar para o templo da Deusa protetora de sua espécie.
Voltavam do templo quando foram tomados por uma forte dor de cabeça, o grito angustiante de Biblioteca explodindo em suas mentes.
E, ao longe, os sinos tocavam, pessoas gritavam, e uma nuvem de fumaça preta se erguia do local onde o vagão estava estacionado.
Dia 26 – Cinzas (Exórdio)
Correram para lá, mentes cheias de angústia. Pessoas se aglomeravam ao redor do vagão, baldes de água passando de mão em mão, tosses secas ecoando pelo espaço, um exórdio de lamentações preso na garganta de cada um ali.
Carantelo chorava, finalmente entendendo a mensagem da caverna. Não era ela ou Amanita que seriam sacrificados naquela aventura: era a Biblioteca, sua melhor amiga, sua conexão de alma, a coisa a qual Carantelo amava mais do que todas as outras.
Naquele dia, o vagão se transformou em cinzas, e a cidade acolheu o luto de Carantelo como se fosse o seu próprio.
Dia 27 – Fagulha (Isagoge)
Permaneceram por dias ali, recolhendo as poucas coisas que sobraram do incêndio. Livros queimaram junto da magia da Biblioteca, pseudodragões foram resgatados.
A cidade ofereceu todo o apoio possível, pois a felicidade que a Biblioteca trouxera naquelas semanas havia mudado a vida de muitos ali.
Carantelo, perdida em seu luto; ao mesmo tempo, Amanita se ocupava com pesquisas, buscando a isagoge da Biblioteca; Carantelo não percebeu a centelha de conexão que ainda se mantinha viva em sua mente. Amanita percebeu.
Era brilhante e pequena, mas era uma centelha. E centelhas podem se transformar em grandes explosões, quando cuidadas da maneira certa.
Dia 28 – Centelha de esperança (Sacaputo)
Quando não tinham mais nada a resolver na cidade, Carantelo e Amanita montaram em Butcher e trotaram para fora das trilhas, sentindo a falta do vagão. Pela primeira vez em muitos e muitos anos, Carantelo permitiu que outra pessoa escolhesse a trilha que seguiriam, abrindo mão da escolha.
— Sabe que a Biblioteca continua viva, né? — Amanita comentou durante a noite; se abrigavam em uma caverna, Carantelo enrolada em um cobertor tal qual sacaputo. A frase, sussurrada, pareceu ecoar.
— O... quê?
— A Biblioteca está viva ainda, Telo. Ela vive em você, em mim, em todo mundo que foi tocado por ela...
Dia 29 – Esperança, pura e simples (Frutescer)
Por longos meses, pesquisaram. Visitaram todos os cantos do mundo em busca da verdade.
Encontraram uma madeira mágica, com a qual construíram viga após viga. Carantelo era vista sussurrando encantamentos contra a madeira, enquanto Amanita aprendeu a arte da forja, aquecendo o aço como aquecia Carantelo nas noites em que compartilhavam camas em estalagens.
E, mais rápido do que esperavam, o vagão ficou pronto.
Carantelo estendeu a mão para Amanita, e os dois tocaram a madeira, buscando aquela centelha novamente, buscando a conexão.
E, como árvore a frutescer, a centelha tornou-se chama, explodindo para fora deles – para dentro do vagão.
Dia 30 – De volta à Biblioteca (Vera)
Carantelo tremia quando a luz parou de ofuscar sua visão. O vagão estava diferente, com uma tonalidade de madeira diversa e novos toques artísticos que antes não existiam.
Mas a irritação na voz da Biblioteca era vera, soou clara como o dia:
“Vocês demoraram demais pra me reconstruir! E eu odiei o verde do telhado!”
Carantelo caiu de joelhos, sendo inundada pelo alívio. Aman riu, revirando os olhos para a irritação, e ajudou o amor de sua vida a entrar pela porta mágica.
Foram recebidos pelos corredores intermináveis de conhecimento e calor da lareira, e pela sensação de casa.
Dia 31 – Um final feliz (andejo)
Quando escutavam os cascos de Butcher ecoando em trote calmo pelas ruelas de pedra, as crianças já corriam para fora, pois sabiam o que significava: a Biblioteca estava chegando.
Por onde passavam, o grupo andejo trazia alegria, histórias, conforto e magia. Carantelo, antes tão acostumada com a solidão, agora via que ela não era a única a manter a Biblioteca viva – mas sim todas as conexões que faziam, extensa como um micélio.
Amanita antes fugia de seu passado. Achava que terminaria sozinho; agora, tinha uma família. Um amor, um lar.
E assim seguiram, cidade após cidade, por uma longa vida.
Espero que tenha gostado! Esssa história foi 100% criada para esse desafio, e por isso foi dividida em vários capítulos 😄 Foi uma loucura escrever a história de amor de um Carantelo e uma Amanita, diferente de tudo que já fiz anteriormente.
Não sei como serão os próximos meses, mas espero conseguir publicar com mais frequência por aqui!
Que ventos tranquilos conduzam sua passagem até nos econtrarmos novamente, Viajante!